População LGBTT pede respeito e dignidade

21/06/2016 - 0:00
População LGBTT pede respeito e dignidade
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“…Pervertido, mal amado, menino malvado, muito cuidado!
Má influência, péssima aparência, menino indecente, viado!
A placa de censura no meu rosto diz: Não recomendado à sociedade.
A tarja de conforto no meu corpo diz: Não recomendado à sociedade…”
(Não Recomendado, Caio Prado – música interpretada pelo Coral do CRJ)

 

O evento de combate à homolesbotransfobia, realizado no dia 17 de junho, no Centro Cultural Mestre Assis do Embu, proporcionou um rico debate sobre os direitos da população LGBTT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais). O que para muitos parece uma coisa simples, como frequentar a escolar, ter um trabalho, ir ao médico ou passear no shopping, para quem é diferente, isso pode parecer um sonho distante. No Brasil, só no ano passado, 318 pessoas foram mortas em crime de ódio, o que representa mais de seis massacres como o da boate Pulse, em Orlando (EUA), ocorrido recentemente. Os dados são do Grupo Gay da Bahia, que aponta também que, a cada 22 horas, um gay é assassinado no Brasil.  

Geanne Greggio, coordenadora do programa de DST/AIDS de Embu das Artes, trabalha na cidade há quase 20 anos. Foi a primeira professora transexual da rede municipal e também do Estado de São Paulo. “Tudo conquistado as duras penas”, segundo ela. Geanne alertou para um dado importante: O Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais no mundo. A coordenadora também esclareceu o nome social, direito garantido pela Administração por meio da Portaria nº 251/13. “Todo mundo pode escolher como prefere ser chamado, inclusive no Sistema Único de Saúde (SUS), o cartão já é impresso com o nome social da pessoa. Esse reconhecimento evita constrangimentos no ambiente de trabalho e em locais públicos, dando mais dignidade a travestis e transexuais.” – afirma.

A mudança de sexo foi aprovada em 1997 e até hoje é vista pela medicina como uma doença. Segundo Geanne, que está se recuperando da sua cirurgia, os interessados em fazer a operação passam por um acompanhamento de dois anos na rede SUS, e existem 5.000 pessoas na fila de espera. Para a coordenadora, o Brasil só começou a falar sobre a diversidade sexual na década de 80, quando no ano de 1983 foi confirmado o primeiro caso de AIDS no país. Daí em diante, surgiram programas de prevenção à doença, ganhando mais investimentos em 2000.

Segundo Sandra Magali Fihlie Barbeiro, secretária de Saúde de Embu das Artes, é preciso respeitar o outro na sua singularidade, investindo no empoderamento do sujeito. Ela lembrou ainda do momento crítico que estamos vivendo no Brasil, com políticos de posições homofóbicas e misóginas. Para Nilton Bispo, assessor de Políticas para a População LGBTT da Secretaria de Assistência Social, Trabalho e Qualificação Profissional, o Dia de Combate à Homolesbotransfobia é uma maneira de colocar na pauta de governo a importância da articulação de políticas publicas para a cidadania da população LGBTT, identifica os sujeitos que precisam dos direitos garantidos, mobiliza a sociedade, os jovens e os agentes públicos a pensarem no acolhimento e atendimento desse segmento.

Ativismo

“Tenho marcas na minha alma”, é assim que o jovem John Lennonn se lembra do tempo de escola. Membro do Centro de Referência da Juventude de Embu das Artes (CRJ) e ativista de vários movimentos em prol da população LGBTT, hoje é estudante de Serviço Social. Para ele, o direito à educação não está sendo garantido, pois não existe a discussão de gênero em sala de aula. Ele também lembrou de um episódio em que já teve de sair escoltado após a encenação de uma peça de teatro para não ser agredido.

Symmy Larrat, primeira travesti a ocupar a função de coordenadora-geral de Promoção dos Direitos LGBT da Secretaria Especial de Direitos Humanos – ela pediu exoneração assim que o presidente interino Michel Temer assumiu –, hoje esta à frente do Transcidadania. Programa de reinserção social da Prefeitura de São Paulo, que oferece a chance a travestis e transexuais por meio da educação e formação profissional.  Natural de Belém, Symmy saiu de casa em busca de uma vida melhor. “Nossa lógica de sobrevivência é cruel” – afirma.

O programa coordenado por ela já foi apresentado em cinco países e é motivo de muito orgulho. Dos 200 beneficiados, 193 estão inscritos no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) deste ano. “Precisamos construir mais espaços dentro da gestão porque o governo passa e a política fica. Onze países da América possuem políticas públicas sólidas e o Brasil ainda não” – relata. Ela também fez questão de esclarecer que as terminologias utilizadas mudam muito porque a população LGBTT está ainda se reconhecendo. “Antes, a gente não podia falar como agora”.  

Para o ator, produtor, pesquisador e ativista, Leandro Lago, a luta contra à homolesbotransfobia é uma luta de classes. “O gay rico não vai mais à Parada Gay porque lá tem muita bichinha pobre, pão com ovo”.

Avanços

Desde junho de 2015, a Ficha de Notificação do Ministério da Saúde acrescentou os crimes de violência contra a comunidade LGBTT. Este documento está disponível em nas unidades de saúde, assistência social e na rede municipal de ensino e é utilizado internamente pelos funcionários quando constatado qualquer tipo de violência. Segundo Leonardo Marcolan, coordenador da Vigilância Epidemiológica de Embu das Artes, ainda não houve nenhuma notificação de violência contra LGBTT. “Nosso objetivo é mapear onde está acontecendo a violência e contra quem” – afirma Marcolan.

Além do nome social, o Fundo Especial de Previdência Social (EmbuPrev), desde sua criação, reconhece a união homoafetiva para fins de benefícios previdenciários. A Prefeitura também mantém um Grupo de Cidadania LGBTT com participação das secretarias de Assistência Social, Trabalho e Qualificação Profissional, Saúde, Cultura, Educação, Esportes e Lazer, Turismo e Guarda Civil Municipal. O encontro é realizado a cada 15 dias e o principal objetivo é discutir políticas públicas para o segmento e fazer com que os direitos LGBTT sejam respeitados.

Ao longo do evento, houve intervenções culturais do CRJ. Representando secretários municipais, estavam Gerusa Alves (Assistência Social, Trabalho e Qualificação Social), Dilson Cruz (Cultura), Vinicius Zammataro (Educação), Eliene de Farias (Esportes e Lazer), além de agentes públicos. Crimes de homolesbotransfobia podem ser denunciados pelo Disque 100. 

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