Ao observar a rotina de trabalho e o modo de vida das formigas, as crianças descobrem como são organizadas as sociedades
Daniela Almeida
novaescola@atleitor.com.br
O dia amanhece. Os operários seguem em direção ao trabalho. Alguns se ocupam da faxina, enquanto outros se responsabilizam pela segurança, fazem pequenos reparos em moradias, transportam alimentos etc. Assim como a rotina dos seres humanos, essa e a vida de abelhas, formigas, vespas e cupins, os chamados insetos sociais. Um assunto rico para ser explorado com as crianças da pré-escola a respeito da natureza e da sociedade, temas que, no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, englobam conteúdos como se¬res vivos e organização dos grupos e seu modo de ser, viver e trabalhar.
"Relacionando o cotidiano e as relações humanas com a organização so¬cial presentes na natureza, o educador estimula a compreensão das diferentes funções, normas e responsabilidades que regulam a vivencia em grupo", afirma Denise Tonello, professora do Colégio Miguel de Cervantes, na capital paulista. Ao perceber que animais tão pequeninos se comportam de modo parecido com os homens, as crianças naturalmente passam a compará-los com sua família:
– As operárias trabalham. A rainha e a mãe. E os soldados são os guardas.
O assunto ainda abre espaço para introduzir os procedimentos básicos da pesquisa científica, mesmo não sistematizados. "O comportamento exploratório das crianças favorece o desenvolvimento de uma postura questionadora", explica Celi Dominguez, professora do curso de licenciatura em Ciências da Natureza da Universidade de São Paulo (USP).
Quando estão em um jardim, os pequenos se divertem acompanhando trilhas de formigas, observando as abelhas nas flores… O conhecimento que eles têrn sobre esses animais provém disso, além da apreciação de desenhos animados e livros infantis – que podem funcionar como o ponto de partida para uma conversa com a turma a fim de descobrir o que todos sabem e confrontar as informações. Materiais de divulgação científica, livros didáticos, músicas e filmes sobre o assunto devem ser analisados também para confirmar informações, corrigir outras e, principalmente, fomentar mais questionamentos. Os animais usam ferramentas para trabalhar? Como falam entre si? A vida da rainha e diferente da dos operários e soldados? "Tão importante como encontrar respostas e incentivar perguntas novas e reflexões baseadas na pesquisa", destaca Celi.
No livro O Diálogo Entre o Ensino e a Aprendizagem, a educadora Telma Weisz aborda a validade de o educador explorar o conhecimento prévio aliado a pesquisa. Ela revela que, durante um projeto de Ciências que implicava a montagem de um formigueiro, as crianças logo partiram para povoar a colônia sem ter feito nenhuma pesquisa em livros. A opção de Telma foi permitir que essa etapa fos¬se pulada (embora essa atitude não seja indicada)."(…) foram para o jardim buscar uma família de formigas para ‘morar’ naquela casa. Suas hipóteses partiam da própria experiência de vida, e para elas o formigueiro era (…) como a casa em que moravam. (…) cada grupo procurou e montou uma família composta de uma formiga grande, uma média e formigas pequenininhas (…). E ficaram todas absolutamente chocadas quando as formigas se mataram umas as outras. Elas haviam misturado formigas de diferentes formigueiros e espécies. (…) pareceu-me perfeitamente razoável os meninos imaginarem que as formigas vivessem de forma idêntica a que eles viviam (…)."
Para trabalhar o tema com a turma da pré-escola da EM Inês Cardoso da Silva, em Embu, na Grande São Paulo, Ligia de Alencar Menezes organizou uma série de atividades sobre a vida das formi¬gas – um inseto social de fácil acesso e controle. "Ao assistir a um desenho que mostrava a vida de formigas, os pequenos notaram que elas eram apresentadas com quatro patas e que fotografias de li¬vros mostravam-nas com seis", recorda a professora. Além de essa diferença ter sido colocada em debate e impulsionado mais pesquisas, todos tiveram a oportunidade de diferenciar o contexto formal do informal, com o qual estão mais acostumados, e refletir sobre o trabalho das formigas apresentado na animação.
Ligia também montou, com a ajuda das crianças, um formigueiro para ficar exposto na sala (Ida a sequência didática na página 67). "Algumas delas nunca tinham visto um de perto. Ficam maravilhadas ao vê-lo crescendo", comenta. A ideia pode ser substituída ou complementada com visitas a centros de estudos profissionais que mantém formigueiros, colmeias e outras colônias. Nesses lugares, o educador pode aproveitar também para aprofundar saberes, conversando com especialistas. “Existem, por exemplo, mais de 800 espécies de abelhas", diz Osmar Malaspina, do Centro de Estudos de Insetos Sociais da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Rio Claro, a 184 quilômetros de São Paulo.
Fonte: Revista Nova Escola – edição 224 – agosto de 2009